12 – Caracterização de filmes finos

Parte I – Transmitância e refletância de um filme fino – Caso Geral
Parte II – Filmes transparentes
Parte III – Medição da transmissão e tratamento dos dados ..

.

Importante !!! O objetivo desta nota experimental, é  somente facilitar o procedimento
experimental no laboratório. Para a preparação da atividade, relatório e seminário não
deixe de consultar a bibliografia sugerida.
Parte I – Transmitância e refletância  de um filme fino – Caso Geral
..
    A expressão da transmitância do filme fino apresentada nesta seção esta baseada nas reflexões mútiplas coerentes e calculada mediante o método das somas de Airy, onde cada termo representa a amplitude do campo eletromagnético da onda com seu correspondente fator de fase. A teoria desenvolvida a seguir assume que as interfaces entre os meios são planas , paralelas e sem rugosidade, esta última condição é necessária  para evitar a introdução de espalhamento nas interfaces e a perda de coerência que leva ao desaparecimento das franjas de interferência.
    Satisfeitas as condições ideais pela teoria, se a absorção for pequena, qualquer que seja a espessura do filme, ha interferência entre os múltiplos feixes refletidos ou transmitidos, gerando o típico padrão de franjas em função do comprimento de onda. Nos filmes reais, no entanto, as irregularidades na espessura do filme podem introduzir mudanças de fase que acabam modificando as condições de interferência do filme ideal.
    Como  o tamanho do feixe utilizado geralmente nos experimentos de espectrofotometria é grande, tipicamente entre 10 e 100 mm2, a intensidade detectada, para cada comprimento de onda, resulta da superposição de ondas com diferentes fatores de fase. O resultado deste efeito sobre as franjas de interferência,  é a diminuição da diferença de intensidade entre máximos e mínimos.  Esta atenuação das franjas depende da relação <x>/l,  onde <x> pode ser definido como o valor médio das irregularidadesde espessura do filme na área coberta pelo feixe. No caso de <x>/l  << 1, a atenuação das franjas será desprezível e os espectros experimentais poderão ser comparados com os resultados teóricos.  Esta condição é geralmente satisfeita nos filmes finos porque sua espessura é bastante constante, mesmo que as irregularidades do substrato não sejam muito pequenas.
    Consideremos um filme absorvente de índice de refração complexo ñ2 = n2 + ik  e espessura d ( o símbolo ~ representa número complexo).  O filme esta localizado entre dois meios transparentes, semi-infinitos, de índices de refração  n1  e n3, ambos reais.  Os coeficientes de Fresnel de reflexão e de transmissão da interface i -j para incidência normal são definidos respectivamente por:
.


….

    As amplitudes resultantes das ondas transmitidas e refletidas pelo filme nos dois sentidos de incidência são determinadas pelos coeficientes de Fresnel do filme [1], [2]:

..
.




……

onde a diferença de fase da onda entre as duas interfaces do filme é definida por:

…..
f/2  = 2 p ñ2  d /l                            (6)
…....

onde l é o comprimento de onda da luz no vácuo.
    Na nossa convenção, meio 1 é o meio incidente, usualmente o ar com n1 = 1 , o meio 2 é o filme e o meio 3 é o substrato, de modo que  r~123 representa a reflexão com a luz incidindo no sentido meio incidente – filme e r321 no sentido contrário ou seja,   substrato – filme.
    As refletâncias nas duas direções de incidência e a transmitância são definidas a partir da relação das componentes normais à interface do vetor de Poynting:

..
R123 =  r~123    r~*123   (7)R321 =  r~321    r~*321     (8)

T123 = ( n3 / n1  )  t~123 +   t~*123= T321    (9)

..

    A igualdade das transmitâncias nas duas direções é uma decorrência da transparência dos meios 1 e 3. O símbolo * indica complexo conjugado.
    As equações 7 até 9, deduzidas para meios semi-infinitos, não podem ser comparadas diretamente com os dados experimentais devido a que na prática o substrato é finito. Introduzindo as reflexões na inteface não considerada nas fórmulas anteriores,  (interface substrato-ar) , segundo o formalismo introduzido por Knittl [3] para fimes finos depositados sobre substratos transparentes ou pouco absorventes, obtemos as seguintes expressões:

..



    Onde R e R’ são as refletâncias nas direções frontal e reversa, e T é a transmitância ( veja fig. 1). O fator U introduz uma eventual absorção do substrato,  pode ser calculado como indicado no apêndice a partir de uma medida independente.

..

Fig. 1 – Interface ar – Vidro – Filme

r = ( r13 )2 (13)
.

é a refletividade da interface meio incidente – substrato .
..
Parte II – Filmes transparentes
.
    No caso de filmes transparentes (k=0), não há absorção de energia, os coeficientes de Fresnell (1) e o ângulo de fase f (6) são grandezas reais. A transmitância em função do comprimento de onda é modulada pelas franjas de interferência, como mostrado na fig. 2. As posições dos extremos (máximos e mínimos) de T ( l ) encontram-se nos comprimentos de onda

Fig. 2 – Franjas de interferencia

lmdefinidos pela condição :

f = 4p n2d  / lm=mp (14)..

onde m= 1,2,3,…… são números inteiros que representam a ordem de cada extremo.  Nos extremos pares  T ( l ) tangencia a curva de transmitancia do substrato, tendo seus valores determinados unicamente pelos índices  n1  e n3 :

2 n1  n3.………
Tpar =   ————–             (15)
n12 +  n32………....

    Nos extremos de ordem ímpar o afastamento de T (l) à transmitância do substrato é máximo. A Amplitude da modulação de T (l) depende da relação entre  n2  e n3 , sendo pequena quando estes índices são similares.  No caso particular  n =  n3 não ha modulação nenhuma.  Os valores de T nos extremos ímpares esta determinado pela equação seguinte:

….
4 n1 n22n3
Timpar =   —————————……..( 16)
(n12+ n22)( n2+ n32)..

    As equações (15) e (16) são obtidas a partir da equação (12) introduzindo as condições k2= 0   e  f = m  ( m par na equação 15 e m  ímpar na equação (16) e U=1 ( correspondente a substrato transparente ). Tímpar   depende de n2 e seus valores experimentais serão usados para determinar o valor deste índice.
    O andamento do espectro do sistema substrato + filme depende da relação entre  n2  e n3 .  Se n2> n3 , T(l) <T  ou seja que os extremos pares são máximos de T(l), como na fig. 2. Se    n2 <  n3, a situação se inverte : T(l) >Tpar ( neste caso os extremos são os mínimos da curva). Vide fig. 3.
    As ordens de interferência m dos extremos podem ser determinadas a partir da equação (14) como será visto na seção seguinte.
    Os valores de lm são determinados experimentalmente com bastante precisão, o que permite obter a partir da Eq. (14) os valôres muito confiáveis do produto:

 

dop = n ( lm ) d  =   m   lm  /4  ( Espessura óptica ou caminho óptico do filme).
..

    No caso de espectros de filmes homogêneos e com intensidades desprezíveis de luz espalhada ou absorvida, os valôres da transmitância nos extremos ímpares são quantitativamente confiáveis e podem ser utilizados para determinar os valores n2  ( lm ) mediante a Eq. (16).  A espessura óptica e o índice de refração do filme nos extremos ímpares fornecem um conjunto de valores da espessura.  Aproveitando apenas os extremos em que a absorção  ainda pode ser considerada desprezível, este conjunto tem um erro estatístico pequeno e sua média é geralmente uma medida bastante precisa da espessura do filme ( aproximadamente 1%).
    O tratamento apresentado nesta seção esta baseado na transparência do material e na validade da Eq. (14). No entanto, na região próxima da borda de absorção existe uma gradativa diminuição de transmitância. Nesta região de transição, onde ainda são aparentes as franjas de interferência, a Eq. (14) pode ser utilizada sem perda de precisão, mas os valôres do índice de refração e da espessura tem erros que podem ser corrigidos usando um método de cálculo de k2   a ser desenvolvido em outro texto.  se esta correção não for feita, a determinação da espessura é insatisfatória como pode ser verificado aplicando métodos menos sofisticados como o apresentado na referência [5].
    Em filmes razoavelmente grossos sem perda da interferência usando os extremos de ordem ímpar é possível calcular um número razoável de valores do índice de refração para diferentes valores de  l e inclusive observar sua dispersão. Esta pode ser modelada de diferentes maneiras. Adotaremos um dos modelos mais frequentemente usados que foi introduzido por Wemple e Didomenico [6]  no qual o índice de refração em função da energia do fóton E=hc/ é definido pela seguinte equação:

     Em Ed
n2 ( E ) =   1 + ————-……( 17 )
      E2m E2

    Os parâmetros   Ee Ed , denominados energia do oscilador e energia de dispersão respectivamente, estão relacionados com a estrutura eletrônica do material. Eles são determinados a partir dos valores experimentais da transmissão mediante um tratamento adequado dos dados.

 

 

Parte III – Medição da transmissão e tratamento dos dados

    Será medido o espectro de transmitânciade um filme de um material dielétrico ou semi condutor de “gap óptico’ largo, de 3 até 5 eV, trnsparente nas faixas infravermelho, infravermelho próximo, visivel  e ultra violeta.
    O equipamento usado é um espectrofotômetro Perkin Elmer com faixa de trabalho entre 180nm até 3200 nm. O espectrofotômetro é um equipamento que permite medir a transmitância e a reflectância de amostras sólidas e liquidas . Geralmente este tipo de equipamento é de duplo feixe, no caso da medida de transmissão, a radiação de um deles atravessa a mostra, o segundo feixe denominado feixe de referencia não sofre interação com a mostra. A transmissão é definida como a relação entre as intesidades de ambos os feixes: T = I / I0  onde I e I0  são as intensidades dos feixes da amostra e de referência respectivamente.
    O equipamento possui um sistema de redes de difração que permitem variair o comprimento de onda da luz dentro de uma determinada faixa que depende do parelho. Veja no Lab. os equipamentos que podem ser utilizados e os princípios de funcionamento dos mesmos.
    Os espectros de transmitância das amostras escolhidas mostram as franjas de interferência na parte transparente e para comprimentos de onda menor ( energia dos fótons maior) observa-se a borda de absorção até a anulação completa da transmitância.
    Na parte final desta seção incluimos uma tabela de daos e resultados correspondentes ao processamento de um espectro de transmissão de um filme de nitreto de silicio amorfo. Estas tabelas podem ser usadas para acompanhar a sequencia de cálculos indicados a seguir.
    Neste trabalho aproveitaremos a parte transparente do espectro para determinar o índice de refração do material, em função do comprimento de onda da luz e avaliar a dispersão deste índice.
    Em primeiro lugar, depois de individualizar no espectro os valores  lm dos extremos, determinamos os valores de m a partir da fórmula 13. Supondo que os caminhos ópticos correspondentes a tres extremos consecutivos são aproximadamente iguais temos:

lm~   ( m +1 ) lm+1 ~   ( m – 1 )  lm-1 ( 18 )
.

        A partir das equações anteriores obtemos duas expressões que podem ser usadas para determinar m de qualquer extremo usando seu comprimento de  onda e o de seu vizinho mais próximo:
….

m   ~lm-1   /  ( lm-1 lm)    ou  m  ~   lm+1   /  ( lm lm+1)( 19 )
..
(Observe que m aumenta e quando  ldiminui).

    No nosso caso n2 > n3  de modo que os máximos correspondem aos valores pares de m, esta paridade deve ser respeitada na hora de estabelecer a correspondência entre extremos e ordens de interferência  m.  Esta correspondência deve ser estabelecida em todos os extremos (máximos e mínimos) até o começo da borda de absorção.
    Uma vez conhecida esta sequencia podemos calcular o caminho óptico em cada extremo:


..d n ( m )  =   m   lm  /4                   ( 14′)
..

    O próximo passo é determinar n  nos extremos ímpares ( mínimos) a partir da fórmula [15], fazendo n=1 e invertendo temos


    Os valôres experimentais de Timpar são tirados do espectro e correspondem à transmitância nos mínimos. Usamos assim as equações ( 20 ) e ( 21 ) obtendo um conjunto discreto de valôres de n2 . Estes valôres do índice do filme e os caminhos ópticos correspondentes ( 14 ‘), determinados acima, permitem um conjunto de valores da espessura  dj cujo valor médio representa em geral com pouca dispersão a espessura real do filme, usualmente com um erro da ordem de 1% a 2% dependendo da qualidade do filme e do espectro que esta sendo usado.
    A análise da dispersão mediante o modelo de Wemple – Didomenico pode ser realizada facilmente linearizando a equação (17):

( n2  – 1 ) -1   =   Em  /  Ed  –  E2/ ( Em   Ed )        ( 22 )
…..

    Onde plotando o primeiro membro em função de E2  devemos ter uma reta que mediante uma regressão linear permite os parâmetros do modelos.  Os valores da energia dos fótons em eV é obtida a partir do comprimento de onda em nm mediante E=1240/l.  A fig. 4 mostra os valores experimentais e a reta da regressão linear.
     O valor de n obtido em E=0

n02  =  1   Ed / Em           ( 23 )

é um parâmetro bastante usado que resulta da aplicação deste modelo. Na tabela 11 há um exemplo deste cálculo usando os dados do filme de nitreto de silicio processado na tabela 1. A figura 4 permite comparar os resultados experimentais de n nos extremos do espectro com a curva contínua do modelo calculada usando os valores obtidos de Em e  Ed.  Os erros dos parametros que se encontram na tab. 11 são desvios estatísticos que não incluem eventuais efeitos devidos a absorção não considerada neste cálculo.

Tabela I
..
Cálculo do índice de refração e da espessura do filme

.m…. ….l(nm) …..ml/4 ………T………. …..n2….. …..dm….. ….n2*…..
5 1149 1436 0.803 1.871 768  
6 962 1443 0.922     1.894
7 823 1440 0.791 1.886 764  
8 725 1450 0.916     1.903
9 645 1451 0.784 1.916 757  
10 584 1460 0.911     1.916
11 532 1463 0.776 1.928 759  
12 490 1470 0.904     1.929
13 453 1472 0.767 1.939 759  
14 425 1488 0.897     1.953
15 398 1493 0.755 1.953 764

N é o número de valores usados para calcular < d >. Na mesma coluna n2*  foram colocados os valores de n2  calculados nos extremos pares usando  < d >  como explicado no texto.

 

Tabela II
..
Aplicação do modelo de Wemple – Didomenico

….m…. ……E ( eV )…… ……..E2……… ……..(n22  – 1 ) -1……..
5 1.079 1.165 0.400
6 1.289 1.661 0.387
7 1.507 2.270 0.391
8 1.710 2.925 0.381
9 1.922 3.696 0.374
10 2.123 4.508 0.374
11 2.331 5.433 0.368
12 2.531 6.404 0.368
13 2.737 7.493 0.362
14 2.918 8.513 0.355
15 3.116 9.707 0.355

Ed = 22.7  + ou –  1.1  eV
Em = 9.04   + ou –   0.03  eV
n0 = 1.874  + ou –   0.004

Referências
[1] M. Born and E. Wolf, Principles of optics,  Pergamon, NY., 1975.
[2] O. S. Heavens, Optical Properties of Thin Films, Butterworth, London, 1969.
[3] Z. Knittl, Optics of Thin Films, Wiley, N.Y., 1976
[4] J. I. Cisneros, G. B. Rego, M. Tomiyama, S. Bilac, J. M. Go’calves, A. E. Rodrigues and Z. P. Arguello. Thin Solid Films, 100 ( 1983)155.
[5]J.C. Manifacier, J. Gasiot and J. P. Fillard of Physics E: Scientific Instruments, 9 (1976) 1002.
[6] S. H. Wemple and Didomenico, Phys. Rev. B, 3 (1971) 1338.