Plasma de Quarks e Glúons (QGP)
A primeira sopa do Universo
Uma sopa é composta por um caldo e ingredientes que podem variar de acordo com o gosto de cada pessoa. No caso da primeira sopa do Universo, os ingredientes são os quarks e glúons, constituintes fundamentais da matéria e partes de um conjunto de partículas chamadas elementares. Os quarks são partículas elementares que constituem os prótons e nêutrons, enquanto o glúon é outra partícula elementar que atua como mediador da força forte, responsável por manter o núcleo atômico coeso. Isso significa que os quarks e glúons interagem fortemente dentro dos nucleons (prótons e/ou nêutrons), trocando glúons entre si e, assim, mantendo o núcleo coeso.
![]() Zoom do núcleo de um átomo |
![]() Quark Up (u) e Quark Down (d) que constituem o Próton e o Nêutron |
Antes de continuarmos falando sobre essa sopa, precisamos falar um pouco sobre os estados mais conhecidos da matéria…
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Transições de Fase: Sólido, Líquido, Gasoso e Plasma
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Agitação das moléculas de água nos estados: Sólido, Líquido e Gasoso.
Imagine que acabamos de tirar a água do freezer. Nesse momento, ela está em seu estado sólido (gelo), onde sua estrutura molecular é razoavelmente fixa. Se aquecermos essa água, sua temperatura aumentará, suas moléculas terão mais energia e ela atingirá o estado líquido. Nesse estado, a estrutura molecular ainda se mantém, mas as ligações moleculares não são tão fortes quanto as ligações no estado sólido. Se aquecermos ainda mais, ela atingirá o estado gasoso (vapor), onde as ligações entre as moléculas estão bem fracas devido à energia que as moléculas ganharam, fazendo com que fiquem relativamente livres. Esses são os três estados mais conhecidos da matéria: sólido, líquido e gasoso.
Agora, se continuarmos a aquecer a água, daremos mais energia às moléculas e aos átomos até que as ligações das próprias moléculas se quebrem, liberando os átomos. Se aquecermos ainda mais, os átomos terão tanta energia que os elétrons se soltarão do núcleo, e com isso, chegaremos a um novo estado da matéria conhecido como plasma. O plasma é o estado da matéria mais presente no universo, aparecendo em alguns fenômenos da natureza, como relâmpagos, luminescência de lâmpadas de luz fria, estrelas, etc.
Bom, então temos os estados: Sólido, Líquido, Gasoso e Plasma!
Da forma como estamos imaginando, já temos uma temperatura, ou seja, energia, altíssima. Mas, e se fornecermos ainda mais energia? Bem, o núcleo dos átomos terá tanta energia que não será mais possível manter os nucleons unidos. Quando atingirmos uma energia extremamente alta, literalmente, os nucleons serão desintegrados, restando apenas uma sopa de quarks e glúons com energias extremamente elevadas. Isso origina um novo estado da matéria chamado Plasma de Quarks e Glúons (QGP), que é uma das coisas mais quente que conhecemos no universo!
Sua temperatura é de cerca de 2 trilhões de graus Celsius, ou seja, 100 mil vezes mais quente que o centro do Sol! Portanto, essa sopa primordial, criada nos primórdios do Universo, é uma das substâncias mais quente que conhecemos! Esse estado da matéria só pode ser encontrado em condições extremas, como nos primeiros 10 microssegundos após o Big Bang ou no núcleo de estrelas de nêutrons.
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Figura representativa da transformação dos Quarks e Glúons livres em Hádrons no ínicio do Universo.
Como estudar a matéria nessas condições tão extremas?
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O maior acelerador de partículas do mundo, o LHC.
Uma das ferramentas desenvolvidas para estudar a estrutura da matéria é o acelerador de partículas. Nele, partículas são aceleradas a velocidades extremamente altas, próximas à velocidade da luz, e então colidem. O estudo do resultado dessas colisões revela informações valiosas sobre a matéria. O experimento ALICE, realizado no Large Hadron Collider (LHC) do CERN, exemplifica esse processo. Ao colidir íons pesados, uma grande quantidade de energia é liberada, criando o Plasma de Quarks e Glúons (QGP) por um breve instante. Essa colisão gera um número imenso de novas partículas, que decaem em outras, deixando rastros de suas trajetórias. Detectores capturam esses rastros, e, através de complexas técnicas de análise de dados, os cientistas reconstroem as trajetórias para desvendar as propriedades da estrutura da matéria.
![]() Experimento ALICE |
![]() Manutenção do ALICE |
Por que estudamos esse estado?
O Plasma de Quarks e Glúons é um laboratório fantástico para se estudar a Interação Forte em detalhes. A Interação Forte não apenas mantém os prótons e nêutrons unidos no núcleo, mas também é responsável pela maior parte da massa que percebemos no nosso cotidiano. Os cientistas possuem uma boa compreensão de como o sistema de atribuição de massas das partículas funciona, mas não a ponto de calcular essa massa com exatidão. Portanto, é necessário estudar a Força Forte mais a fundo, e o Plasma de Quarks e Glúons é perfeito para essa finalidade.
Além disso, o Plasma de Quarks e Glúons é um campo de estudo de fronteira na Física de altas energias, o que significa que ainda há muito a ser descoberto sobre ele. Logo, um grande desenvolvimento experimental e teórico é necessário para aprofundar nosso entendimento sobre esse estado extremo da matéria. O desenvolvimento experimental pode gerar novas tecnologias e avanços tecnológicos para a sociedade, enquanto o desenvolvimento teórico aprimora nossa compreensão sobre os mecanismos que regem a estrutura da matéria. A importância dos desenvolvimentos em pesquisa básica, experimental e teórica reside na grande contribuição que essas pesquisas oferecem à sociedade. Por exemplo, o desenvolvimento da World Wide Web (WWW) foi realizado por um cientista que trabalhava no CERN (Organização Europeia para a Investigação Nuclear) com o objetivo de automatizar o compartilhamento de informações entre cientistas em universidades e institutos ao redor do mundo.
![]() Primeiras colisões de prótons com íons de chumbo no LHC. |
![]() Eventos registrados pelo experimento ALICE a partir das primeiras colisões de íons de chumbo, com uma energia de centro de massa de 2,76 TeV por par de nucleons. |
Links interessantes sobre o Plasma de Quarks e Glúons:
- Vídeos voltados para a divulgação
- Compartilhamento de estudos
- O Prof. Fernando Gardim compartilha o resultado de um estudo de 2020, sobre o QGP e sua relação com temperatura. 6min 15s (Português)
- O Prof. Marcelo Disconzi compartilha o resultado de um estudo teórico de 2021, sobre um conjunto de equações que são condizentes com a física do QGP. 6min 52s (Português)
- Palestras sobre o QGP
- Palestra do Prof. Tiago Nunes (UFSC) de 2021 na VIII Semana Acadêmica de Física da UFSC. 50min (Português)
- Palestra do Jhoão Gabriel M. C. de A. Arneiro, aluno de IC do Prof. Alexandre Suaide – IFUSP em 2021, no canal SciPhyD Discussões, sobre o Física de partículas e o plasma de quarks e glúons no início do universo. 1h 33min 55s (Português)