Um dispositivo muito comum e fundamental para minimizar perdas em transmissão de energia elétrica por longas distâncias é o transformador. Utiliza alguns princípios físicos básicos, apresentados anteriormente, para transformar o valor de uma voltagem alternada, diminuindo ou aumentando sua amplitude máxima (já justificamos na aula sobre dissipação ôhmica, porque é interessante utilizar altas voltagens em linhas de transmissão). Relembro aqui tais princípios:
- Lei de Biot-Savart – corrente elétrica gera campo magnético.
- Materiais ferromagnéticos – alinham seus dipolos magnéticos na presença de um campo magnético externo, gerando um campo magnético próprio.
- Lei de Faraday – variações de fluxo magnético geram campo elétrico, que por sua vez gera corrente.
Um transformador consiste em um material ferromagnético, usualmente o próprio ferro, enrolado por dois conjuntos de fios condutores, chamados de enrolamentos primário e secundário. Quando uma corrente elétrica passa no enrolamento primário, cada volta deste enrolamento produz um campo magnético similar àquele de um anel com corrente. Como temos várias voltas, estes campos se somam, produzindo um campo magnético final, proporcional ao número de voltas e à corrente de entrada.
O núcleo de ferro “carrega” estas linhas para o enrolamento secundário. Como a corrente primária é alternada, o campo magnético criado oscila com o tempo. Esta variação gera uma força eletromotriz em cada volta do enrolamento secundário, que, somadas, criam uma diferença de potencial total entre a entrada e a saída deste, a qual é proporcional ao seu número de voltas e à amplitude do campo magnético oscilante.
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Considerando todas estas proporcionalidades, podemos montar a seguinte relação entre tensões de enrolamentos primário e secundário, correntes elétricas e número de espiras (em um transformador ideal):
onde N é o número de espiras, U é a voltagem e I é a corrente. Ou seja, controlando o número de espiras, podemos elevar ou reduzir voltagens, diminuindo ou aumentando, respectivamente, a corrente elétrica.
Com isso, conseguimos utilizar a voltagem alternada para compatibilizar transmissão e uso de energia elétrica de forma eficiente. A transmissão requer grande voltagem, gerando pequenas correntes e minimizando a dissipação ôhmica. O uso doméstico, por outro lado, requer baixas voltagens, por questões de segurança, mas com grandes correntes para o uso eficiente de aparelhos eletrônicos. E, para isso, transformadores aumentam a voltagem nas saídas de usinas para transmissão e diminuem a voltagem em casas de força e postes próximos de casa, para o uso seguro da energia elétrica.
Neste curso, estamos sempre preocupados em não criar energia do nada, e saber exatamente para onde vai a energia dissipada. Em um transformador ideal, não há perda de energia, uma vez que a potência elétrica é calculada como o produto da corrente pela voltagem. Como em um transformador estas grandezas variam inversamente uma em relação à outra, a potência elétrica é idêntica nos dois enrolamentos.
É razoavelmente fácil montar um transformador em um laboratório de eletrônica. Uma proposta simples é detalhada aqui. Uma discussão dos conceitos físicos envolvidos pode ser encontrada no material do GREF (na aula 4 de Eletromagnetismo).
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Outro dispositivo eletrônico muito útil em nossos equipamentos é o indutor. Vimos que, pela Lei de Faraday, uma variação de fluxo magnético gera uma força eletromotriz em um circuito. Vínhamos considerando que este campo magnético era gerado por algo externo ao circuito. Mas o que ocorre, se ele é gerado por uma corrente atuando no próprio circuito?
Pensemos primeiramente em uma bobina sem corrente. De repente, conectamos as extermidades desta bobina a uma diferença de potencial constante. A Lei de Ohm diz que uma corrente constante passará a correr na bobina, cujo valor dependerá da resistência do circuito. Mas esta não é a história completa, pois sabemos que no momento em que uma corrente começa a correr, um campo magnético é gerado, originando uma força eletromotriz contrária, que age no sentido contrário à diferença de potencial externa. No final das contas, o valor constante de corrente calculado pela Lei de Ohm é atingido, mas não imediatamente, pois a diferença de potencial tem de vencer a força contraeletromotriz. O componente eletrônico que produz este efeito é chamado de indutor, representado pela letra L, e desenhado como uma mola em circuitos esquemáticos.
Uma explicação do funcionamento de indutores é discutida aqui. Programas que simulam montagens de circuitos podem ser encontrados na Internet. Tente reproduzir o circuito mostrado neste simulador, e observe se a simulação corresponde ao esperado.
Um fenômeno interessante envolvendo o indutor ocorre se o ligarmos a uma corrente alternada. Neste caso, mesmo se a resistência do circuito for nula, não ocorre o curto-circuito, por conta da força contraeletromotriz presente no indutor. Em vez disso, uma corrente é produzida e fica oscilando fora de fase em relação à voltagem externa. É como se houvesse uma resistência ligada no circuito, mas com significado físico muito diferente. Damos, portanto, outro nome a esta propriedade: reatância.
Um tratamento analítico mais detalhado, onde algumas contas envolvendo indutores são apresentadas, pode ser encontrado aqui.
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Assim como os indutores, os capacitores são largamente utilizados em circuitos eletrônicos. Um capacitor é um dispositivo com uma capacidade de acumular cargas elétricas, e que, uma vez totalmente carregado, corta a corrente do circuito ao qual está conectado. São representados pela letra C, e desenhados como duas placas paralelas em circuitos esquemáticos. Uma discussão detalhada pode ser encontrada aqui.
Um exemplo familiar de capacitor é o flash da máquina fotográfica. Este capacitor é lentamente carregado através da bateria da máquina, e depois de carregado pode liberar suas cargas todas de uma vez, gerando uma corrente intensa, mas que dura somente um instante de tempo. Mas, durante este instante, esta corrente pode ser usada para criar a intensa luz utilizada no flash.
Se formarmos um circuito simples, ligando o capacitor, uma resistência e uma fonte de corrente contínua, este circuito gerará uma corrente que diminuirá com o tempo, se anulando, quando o capacitor estiver completamente carregado. Agora, se substituirmos a fonte por outra de corrente alternada, teremos corrente alternada que, como no caso do indutor, estará fora de fase em relação à voltagem externa.
Esta corrente oscilatória estará presente, mesmo se retirarmos a resistência. Após uma forte descarga inicial, que carrega o capacitor, o sistema produzirá uma corrente. Estes experimentos podem ser facilmente realizados em um laboratório simples de eletrônica. Também podem ser simulados na Internet, na página da Phet.
Novamente, como no nosso circuito com o indutor, não há uma resistência presente, mas, por causa do capacitor, é como se houvesse uma resistência no circuito, e portanto podemos novamente falar de reatância. Lá no começo do curso, mencionei uma grandeza muito presente em dispositivos eletrônicos, como, por exemplo, em caixas de som, a impedância. Falei que a impedância era como uma resistência, medida também em Ohms, e que é justamente o efeito combinado da resistência e das reatâncias capacitivas e indutivas, que geram certo valor de corrente, devido a uma voltagem externa.
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Um circuito particularmente interessante para aplicações é o circuito LC, onde uma indutância e um capacitor são ligados em série. Se carregarmos previamente o capacitor através de uma fonte externa, quando o conectamos ao circuito, um efeito interessante ocorre. No momento em que ligamos o circuito, uma corrente começa a fluir. Porém, por causa do indutor, esta corrente cresce lentamente, ao invés de descarregar instantaneamente o capacitor, como no flash fotográfico mencionado antes.
Este processo ocorre até que o capacitor esteja completamente descarregado. Neste instante, a corrente deveria cessar, pois não há mais carga no capacitor. Porém, o indutor impede o decréscimo repentino da corrente, que passa a diminuir lentamente. Mas, neste processo, o capacitor volta a ser carregado. Quando a corrente finalmente cessa, o capacitor está com a mesma carga, porém com uma polaridade invertida em relação à configuração inicial. O processo se reinicia, agora com a corrente fluindo na direção oposta. O resultado é que este sistema gera uma corrente alternada que flui indefinidamente, se não houver perdas.
Do ponto de vista energético, podemos fazer uma analogia com um balanço de parque. Quando o balanço está no alto, temos energia potencial acumulada, o que corresponde ao capacitor carregado com energia acumulada em campos elétricos. Ao descer, o balanço converte energia potencial em energia cinética, criando movimento. No circuito, cria-se corrente, o que acumula energia em campos magnéticos. Esta transferência de energia em campos elétricos e magnéticos continua indefinidamente, assim como o movimento de um balanço.
A frequência da oscilação, ou seja, o número de vezes em que o sistema volta à sua configuração inicial por unidade de tempo depende das características do capacitor e do indutor. Esta frequência é chamada de frequência natural do circuito. Mantendo a analogia com o balanço, este também tem uma frequência natural de oscilação, que depende do seu tamanho (e do valor da aceleração da gravidade).
As reatâncias indutiva e capacitiva diferem da resistência em muitas formas, em particular pela dependência de seu valor com a frequência de oscilação da corrente alternada. No que se refere a essa dependência, assinale abaixo a alternativa correta (dica: lembre-se que para frequências muito pequenas, tendendo a zero, devemos reproduzir o comportamento de um circuito com uma diferença de potencial contínua):
a) Ambas crescem com o aumento da frequência.
b) Ambas diminuem com o aumento da frequência.
c) A reatância indutiva cresce com o aumento da frequência, enquanto a reatância capacitiva decresce.
d) A reatância indutiva decresce com o aumento da frequência, enquanto a reatância capacitiva cresce.