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04 – Motores Elétricos

Retomemos o exercício de fixação da semana passada, quando comparamos duas bicicletas com dínamos descendo uma ladeira. Por simples conservação de energia, podemos concluir que a bicicleta com o dínamo conectado desce mais lentamente, por causa da dissipação ôhmica presente na lâmpada do dínamo.

 

 

 

Para entender o mecanismo de frenagem da bicicleta, temos de voltar à Lei de Lenz e observar atentamente o campo magnético induzido pela corrente elétrica criada. Este ponto já foi discutido brevemente, ao notarmos que, tanto para aproximar quanto para afastar um ímã de um circuito, temos de vencer uma resistência ocasionada pelas interações magnéticas entre ímã e circuito. Vamos agora adaptar esta explicação para uma situação mais próxima do dínamo considerado.

 

 

 

Suponhamos que, em uma mesa lisa, colocamos um ímã para girar livremente, de forma que a direção para onde os polos norte e sul apontam fique mudando constantemente. Se não houver atrito, este ímã seguirá girando indefinidamente. Agora, coloquemos próximo a este ímã uma bobina, na qual uma corrente pode ser induzida.

 

 

 

Tomando o momento quando o polo norte do ímã aponta na direção da bobina como instante inicial, vamos analisar o que ocorre. Neste instante, as linhas de campo magnético apontam na direção da bobina, portanto o fluxo magnético é máximo. Com a rotação do ímã, o polo norte começa a apontar em outra direção, e o fluxo magnético que passa pela bobina diminui. A Lei de Lenz nos diz que uma corrente é criada no sentido de gerar um campo magnético, com o polo norte apontando na direção oposta àquela onde se encontra o ímã.

 

P2.

Vimos anteriormente que dipolos magnéticos desalinhados sofrem um torque que age no sentido de realinhá-los. Este efeito pode ser facilmente observável, se temos dois ímãs e rodamos um deles. Por exemplo, alguns limpadores de aquários consistem de dois ímãs revestidos, onde um deles fica dentro do aquário e o outro fora. A atração magnética faz com que estes ímãs grudem no vidro do aquário, e, mexendo o ímã exterior, mexemos também o ímã do interior. E, se rodamos o ímã de fora, o ímã de dentro gira na mesma direção. Um vídeo caseiro e simples mostrando tal fenômeno pode ser visto aqui.

 

 

 

Retomando nosso ímã girando em uma mesa, podemos perceber que o campo magnético criado pela corrente na bobina aponta na direção para onde o ímã apontava instantes atrás. Portanto um torque age no ímã, tentando fazer com que ele volte ao alinhamento que acabou de abandonar, e freando

o seu movimento.

 

 

 

Suponhamos agora que este torque não foi suficiente para parar o ímã após meia-volta completa. Agora o polo norte do ímã aponta na direção oposta à bobina, e o polo sul aponta em sua direção. Novamente, a partir deste instante, podemos fazer o mesmo raciocínio anterior, mas a corrente gerada na bobina terá sua direção invertida, criando um campo magnético com o polo sul apontando na direção oposta ao ímã. Novamente o mesmo torque restaurador aparece, freando o movimento giratório do ímã.

 

 

 

Portanto temos dois efeitos simultâneos ocorrendo. Na bobina, uma corrente alternada é induzida, com sua direção mudando a cada meia-volta que o ímã dá. E a todo instante há um torque atuando no ímã, freando o seu movimento.

 

 

 

Este é exatamente o mecanismo presente no dínamo da bicicleta, ou seja, a corrente induzida gera um campo magnético que, por sua vez, se opõe ao movimento de rotação do ímã. Como o ímã está acoplado à roda, esta frenagem é transmitida para a bicicleta, que freia.

 

P3.

Neste exemplo, agimos no ímã e observamos a criação de corrente. Mas podemos inverter a causa e o efeito. O que ocorre, se tivermos um ímã parado em cima de uma mesa lisa, e próximo a ele ligarmos uma corrente em uma bobina? Os mesmos mecanismos físicos descritos anteriormente farão com que os polos do ímã se alinhem ao campo magnético criado pela corrente da bobina, fazendo o ímã oscilar em torno de uma posição de equilíbrio.

 

 

 

Se o ímã não entrar em atrito com a mesa, seguirá oscilando indefinidamente em torno do equilíbrio, uma vez que o torque atua sempre no sentido de restaurar a posição onde seus polos magnéticos estão alinhados com os da corrente na bobina. Mas o que ocorre, se desligarmos a corrente justamente no instante em que o ímã passa pela posição de equilíbrio? Neste caso, o ímã seguirá girando livremente. Agora, se religarmos a corrente no exato instante em que o ímã completar meia-volta, o torque agirá novamente no mesmo sentido, aumentando a sua velocidade de rotação. Assim, desligando e religando a corrente nos momentos certos, o ímã irá girar cada vez mais rápido. É este o princípio que está por trás dos motores elétricos.

 

 

 

É claro que esta concepção pode ser refinada, fazendo com que o sistema fique mais eficiente. Por exemplo, ao invés de desligarmos a corrente, podemos inverter o seu sentido. Assim, a rotação do ímã é acelerada em todos os instantes. Ou então podemos fixar os ímãs, e fazer girar uma bobina por onde uma corrente variável é ligada. Ou ainda substituir todos os ímãs permanentes por eletroímãs, ou seja, circuitos que geram campos magnéticos ao ligarmos uma corrente (um bom resumo destas opções pode ser encontrado aqui). O problema é como implementar estas ideias de forma eficiente, em um motor elétrico de verdade.

 

P4.

Um motor elétrico simples consiste em uma bobina, na qual pode passar uma corrente elétrica, desligada e ligada periodicamente, e um ímã acoplado a um eixo de rotação. Durante o período em que está ligada, a corrente é mantida em um valor constante através de uma bateria externa. Vimos que, ligando e desligando a corrente com certa frequência, podemos fazer o ímã girar com esta mesma frequência. O eixo acoplado ao ímã gira, podendo realizar trabalho.

Assinale a única alternativa correta que descreve de onde provém a energia para a realização deste trabalho.

 

 

 

a) A corrente na bobina dispersa energia por dissipação ôhmica. Durante o funcionamento da bobina, esta dissipação ôhmica diminui, para que a energia possa ser transferida para o motor.

 

 

 

b) A energia vem da estrutura interna do ímã, que aos poucos começa a se desmagnetizar, e enfim cessa o movimento (por isso os ímãs devem ser periodicamente trocados em motores elétricos). 

 

 

 

c) A variação de fluxo magnético proveniente do ímã na bobina cria uma força eletromotriz que se opõe à corrente presente no ímã. Para manter esta corrente constante, a bateria externa tem de fornecer mais energia.

 

 

 

d) O sistema descrito consiste em um autêntico moto-contínuo, sendo fisicamente impreciso dizer de onde vem a energia que alimenta o motor.

 

P5.

O primeiro dispositivo elétrico que converte energia eletromagnética em energia mecânica a ser construído foi o motor homopolar, no qual não há inversão dos polos magnéticos (daí o nome). Na Internet, este dispositivo pode ser encontrado pelo sugestivo nome de “motor mais simples do mundo“. Neste motor, um ímã é acoplado à parte de baixo de uma pilha, e um pequeno circuito conecta o polo positivo da pilha ao ímã.

 

 

 

Quando montamos o aparato, a corrente corre pelo fio (o ímã deve ser feito de material condutor, nesta montagem), e, como este fio está imerso em um campo magnético, os elétrons irão sentir uma força na direção perpendicular à do fio. Como estes elétrons estão confinados, correndo no fio, esta força acaba sendo transferida para o fio, gerando nele um torque em relação ao eixo central, fazendo-o rodar. E o sentido do torque é o mesmo para os dois lados do circuito, como pode ser visto pelo esquema da figura.

         Existe outra versão deste motor, na qual o circuito é mantido fixo e é a pilha que gira. Você pode explicar microscopicamente por que esta pilha está girando?

 

P6.

Um motor elétrico pode ser construído de várias formas diferentes, mas todos se baseiam na interação entre dois campos magnéticos, um deles acoplado a um eixo de rotação e o outro fornecido externamente. O dispositivo acoplado ao eixo de rotação é chamado de rotor e o dispositivo fixo externo é denominado estator.

 

 

 

Uma montagem bastante simples de um motor elétrico pode ser construída com um ímã permanente, um fio elétrico e uma pilha. Demonstrações deste motor podem ser encontradas em vários locais na Internet, como, por exemplo, aqui ou aqui. Neste motor, o rotor é constituído por uma bobina formada a partir de um fio elétrico enrolado, conectada a uma pilha. O estator é formado por um ímã permanente, fixado nas proximidades do nosso circuito.

 

 

 

O restante desta discussão será muito mais facilmente entendida, após você ver o vídeo sugerido acima. Faz-se passar uma corrente na bobina, conectando-a a uma pilha. Esta corrente gera um campo magnético, que tende a ser alinhado com o campo magnético do estator, ou seja, do ímã externo, fazendo a bobina girar.

 

 

 

A parte do fio elétrico da bobina que faz o contato com a pilha é descascada somente de um lado. Isso faz com que o contato da pilha com a bobina seja desligado a cada meia-volta. Enquanto este contato está desligado, a bobina gira por inércia, não havendo nenhuma corrente elétrica passando, e portanto nenhuma interação entre campos magnéticos. Isto impede que as interações eletromagnéticas freiem o movimento de rotação, quando a bobina estiver orientada na direção “errada”. Mas assim que ela retorna à orientação “correta”, o contato é restabelecido e o torque magnético volta a atuar.

 

 

 

Motores elétricos deste tipo são chamados de motores de corrente contínua, ou motores CC, pois a corrente que os faz funcionar é contínua. Veremos a seguir como melhorar a eficiência destes motores, utilizando uma montagem mais sofisticada.

 

P7.

O primeiro passo para aumentar a eficiência do nosso motor elétrico é fazer com que um torque magnético esteja sempre presente, e não somente na metade do tempo. Uma forma de fazer isto é obter um dispositivo mecânico para inverter o sentido da corrente que passa pela bobina a cada meia-volta. Este dispositivo é chamado de comutador.

 

 

 

O contato entre a fonte e a bobina é feito de forma deslizante, entre dois contatos chamados de Escova, cada um ligado a uma saída da nossa fonte de voltagem, e duas placas que estão acopladas ao eixo da bobina. À medida que a placa gira, o contato entre ela e a escova muda de posição, até que a placa “acaba” e o contato é desfeito. Mas, logo em seguida, este contato é refeito, desta vez com a segunda placa. Desta forma, a cada meio ciclo, a corrente que atravessa a bobina muda de direção, e o torque magnético sempre age no sentido de girar a bobina.

 
 

 

 

Uma característica curiosa dos motores CC sem comutador é que o sentido de rotação do eixo não está preestabelecido. A direção de rotação dependerá da configuração inicial da bobina, quando ligamos a corrente, o que é uma óbvia desvantagem para a aplicação deste motor. Com o comutador, isto já não acontece, pois, para certa direção de corrente, a bobina sempre gira no mesmo sentido. Porém, se invertermos a fonte, mudando o sentido da corrente, invertemos também o sentido de movimento do rotor. Obviamente esta não é uma boa configuração, se a nossa fonte for de corrente alternada.

 

P8.

A maioria dos motores elétricos encontrados em casa não funciona com corrente contínua, mas é alimentada pela tensão da rede elétrica. Portanto, a corrente é alternada, oscilando a 60 Hz, ou 60 vezes a cada segundo. Deste modo, um motor CC, projetado para funcionar com corrente contínua, não opera adequadamente, quando alimentado por corrente alternada.

 

 

 

Uma adaptação adequada do motor elétrico considerado, que resolve este problema, é o motor universal, no qual a corrente criada pela tensão da rede é a responsável pela formação dos campos magnéticos tanto do rotor quanto do estator. O circuito todo é ligado em série, onde a corrente elétrica passa primeiro pela bobina dos estatores, em seguida por um comutador, pela bobina do rotor, retorna ao segundo comutador, e finalmente fecha o circuito na fonte.

 

 

 

Tomando a configuração da figura, vamos supor que a corrente saia da fonte para a direita. Neste caso, seguindo a direção da corrente, podemos estabelecer que o polo norte dos campos magnéticos dos estatores aponta para a esquerda, e o polo norte da bobina do rotor aponta para cima, gerando um torque necessário para girar a bobina no sentido anti-horário. Podemos ver também que esta conclusão será a mesma, depois da bobina completar meia-volta por causa da ação do comutador.

 

 

 

Agora, se a corrente sai da fonte para a esquerda, todas as orientações de polos magnéticos se invertem, mantendo o torque na mesma direção. Só há uma direção de rotação possível para esta configuração. Se for necessário inverter a direção de rotação da bobina, você saberia dizer que modificação deveria ser feita neste circuito?

 

 

 

Esta montagem funciona tanto com corrente alternada quanto com corrente contínua, e está presente, por exemplo, em batedeiras e ventiladores domésticos.

 

P9.

Outra forma alternativa de construção de motores elétricos cria os campos magnéticos no rotor por indução de Faraday. Ou seja, não há nem ímãs permanentes nem circuitos alimentados por correntes externas no rotor. Este é formado por um material condutor, de forma que uma variação de campo magnético externo lhe induz uma corrente. Esta corrente sente os efeitos do campo magnético externo, fazendo com que o rotor comece a girar.

 
 

 

 

Por necessitar de campos magnéticos variáveis para seu funcionamento, este motor funciona somente com corrente alternada. Além disso, muitas vezes, através de montagens adequadas, o campo magnético do estator também gira, ao invés de somente mudar de intensidade. Detalhes de implementação destes motores envolvem montagens eletrônicas sofisticadas, que fogem ao escopo destas aulas (detalhes de algumas configurações podem ser encontradas aqui).

 

 

 

Os motores elétricos têm uma história de mais de um século, período em que sucessivas melhorias foram sendo feitas, no sentido de tornar o motor mais robusto, mais eficiente e mais potente. Então é de se esperar que os motores elétricos que encontramos por aí tenham vários aspectos e detalhes de construção que não foram apresentados aqui. Mas acredito ter abordado as características fundamentais destes motores. Vários detalhes de montagens experimentais de motores simples podem ser encontrados aqui.